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Feromônios: mito ou verdade?

  • Foto do escritor: Fernanda Ramos
    Fernanda Ramos
  • 2 de dez. de 2019
  • 4 min de leitura


É possível que você tenha ouvido falar da ação dos feromônios na sincronização do ciclo menstrual em mulheres de convívio próximo ou que tenha encontrado uma variedade de produtos contendo feromônios, como perfumes, cremes, hidratantes corporais, extratos concentrados, todos com proposta de sedução, maior atração, e melhora da performance pessoal (e sexual).


E a pergunta imediata a tudo isso é: FUNCIONA? É REAL?



Pra começar, feromônios são sinais químicos envolvidos na comunicação com outros membros da mesma espécie. É quando uma mensagem química desencadeia efeitos específicos no receptor. Essas respostas são inatas, embora possam ser modificadas pela experiência e dependente do contexto. Não se restringe apenas a comportamento sexual, está envolvida na comunicação em geral.

Esses sinais são iniciados por odores, que ativam um órgão sensorial capaz de transmitir informações ao cérebro para identificar comportamentos relevantes e/ou disparar efeitos fisiológicos. O órgão responsável por isso em mamíferos se chama órgão vomeronasal ou órgão de Jacobson.



Há boas evidências para apoiar a presença dos feromônios em seres humanos, que incluem efeitos no

ciclo menstrual, reconhecimento olfativo do recém-nascido por sua mãe, dos indivíduos poderem exalar odores diferentes com base no humor, até mesmo no processo de escolha de parceiro e atração sexual. No entanto, a realidade é outra.






Os efeitos encontrados dos possíveis feromônios em humanos estão muito distantes dos efeitos feromonais observados em animais. Podemos considerá-los, no máximo, como possíveis moduladores de variáveis psicológicas, fisiológicas e culturais, que tem grande impacto na nossa comunicação. Essas variáveis podem, então, funcionar com efeito análogo aos feromônios, não sendo necessária essa sinalização via odor.

Além disso, a sexualidade humana difere dos animais, escapando às necessidades feromonais às quais os animais estão obrigados a reconhecer e encontrar o sexo oposto para garantir a sobrevivência da espécie.


A gente pode até dizer que por sermos mamíferos necessariamente temos feromônios, ainda que não identificados, mas as negativas encontradas nos estudos podem se apoiar na perda de respostas aos feromônios pelo processo evolutivo, devido à falta de pressão na seleção natural. A comunicação pelo odor não é, afinal, tão importante quanto outras variáveis de comunicação, embora tenhamos glândulas secretoras que poderiam ser usadas para produzir feromônios.


E tem mais! Mesmo que a gente produzisse feromônios, nós não temos um órgão vomeronasal funcional. Jacobson, já em 1810, apontou isso.


Em humanos, o órgão vomeronasal se desenvolve no útero, derivadas do placode olfativo, com fibras nervosas conectadas ao cérebro e logo se degenera após outros neurônios que contêm gonadotrofina serem formados. Esse processo e o desenvolvimento adequado das estruturas de hipotálamo e hipófise serão importantes no desenvolvimento do sistema reprodutivo. Após isso, no entanto, o órgão vomeronasal regride e fica vestigial em adultos.

É possível visualizar o órgão numa tomografia computadorizada, na base do septo nasal. Histologicamente não são encontrados neurônios receptores epiteliais e de inervação que permitiria o transporte de informações para o cérebro pelo órgão vestigial. Ainda, geneticamente as proteínas receptoras são desativadas e apenas 5 sequências permanecem no genoma, enquanto nos mamíferos que possuem o órgão vomeronasal há mais de 180 sequências. E, os genes que codificam os canais essenciais para ativação do neurônio vomeronasal são incapazes de dar origem a canais iônicos funcionais.


Portanto, em adultos o órgão vomeronasal não é funcional.


Vários estudos se debruçam sobre essa possível existência de comunicação química em humanos, sem sucesso. O que temos até o momento:


Qual fonte dos nossos possíveis feromônios? Axilas! Por que? Feromônios são secretados em uma área que geralmente contém cabelos, que aumenta a superfície de dispersão, são aquecidos para ajudar na volatilização e estão posicionados quase no nível do nariz do destinatário. As secreções axilares conteriam odores exclusivos para identificação dos indivíduos. É daí que vem moléculas de androsteno usadas nos estudos e nos produtos comercializados.


O fato é que não se tem base científica para tratar as moléculas de androsteno como feromônios humanos, não podendo justificar os efeitos observados.


Neste ponto você já deve ter percebido o óbvio: o que é vendido como feromônio e todas as funções dadas aos produtos não passam de falácia. Primeiro que não temos receptores para feromônio, segundo que a molécula base utilizada nos produtos não é considerada um feromônio de fato.


Porém, fatos interessantes observados nos estudos sem comprovação dos mecanismos de ação e de atuação de feromônios:


  • Homens cheirando camisetas usadas por mulheres em período de ovulação mostram níveis mais altos de testosterona do que homens cheirando camisetas de mulheres fora desse período.

  • Compostos retirados de axilas de mulheres na fase folicular terminal do ciclo menstrual e aplicado no lábio superior de mulheres aceleraram o pico do hormônio luteotrópico e encurtaram seu ciclo menstrual, enquanto os compostos axilares da fase de ovulação, prolongam o ciclo, o que justificaria a sincronização do ciclo menstrual em mulheres que tem convivência muito próxima.

  • Odores obtidos nos seios de mulheres que amamentam interrompeu “a regulação homeostática normal do ciclo menstrual” em outras mulheres nulíparas que receberam os sinais químicos. O efeito foi pronunciado –a variabilidade em ciclos aumentou três vezes- e foi sugerido que desempenhasse um papel na fertilidade na população geral de mulheres.

Nossa principal fonte de um primeiro feromônio identificável pode estar na amamentação, que é um comportamento em mamíferos onde o cheiro é conhecido por ser importante. A secreção produzida pelas glândulas de mães humanas em lactação a partir de aréola se colocada debaixo do nariz de qualquer bebê dormindo, o bebê responde com comportamento de sucção e busca de mamilos. Promissor, sem tantas variáveis confundidoras e vieses, eu diria!


Portanto, não se engane por propagandas, acredite no seu potencial, não use feromônios como desculpa, e a resposta pra tudo isso é ‘não, porém depende’! :P


Para saber mais, assista (em inglês):


Trotier D. Vomeronasal organ and human pheromones. European Annals of Otorhinolaryngology, Head and Neck diseases (2011) 128, 184—190

Wyatt TD. The search for human pheromones: the lost decades and the necessity of returning to first principles.2015. Proc. R. Soc. B 282: 20142994.

Wyatt T. Pheromones. Current Biology 27, R731–R745, August 7, 2017

Wysocki CJ, Preti G. Facts, Fallacies, Fears, and Frustrations With Human Pheromones. THE ANATOMICAL RECORD PART A 281A:1201–1211 (2004)

Oren C, Peled-Avron L, Shamay-Tsoory SG. A scent of romance: human putative pheromone affects men’s sexual cognition. Social Cognitive and Affective Neuroscience, 2019, 719–726



 
 
 

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