Por que saber sobre agrotóxicos afeta sua vida?
- Fernanda Ramos
- 6 de jan. de 2017
- 4 min de leitura
“Comer é um ato político”. Se você já não ouviu essa frase de Michael Pollan, é um bom momento para conhecê-la e refletir sobre ela.
No mundo, o Brasil está desde 2009 em 1º lugar no consumo de agrotóxicos e não há nada que se orgulhar de estar no topo desse ranking.
São adquiridos e utilizados cerca de 1 milhão de toneladas de agrotóxicos por ano, que corresponde a uma exposição média dessas substâncias de 5,2kg por pessoa! Isso está relacionado a liberação do uso de sementes transgênicas no país, que exigem o uso de grandes quantidades de agrotóxicos no cultivo, à isenção de impostos à indústria produtora de agrotóxicos e ao uso de agrotóxicos já proibidos em outros países.
Esses herbicidas, inseticidas e fungicidas contaminam o solo, os alimentos, que ficam com as cascas impregnadas, o ar e a água, além de poder intoxicar os trabalhadores rurais, que tem contato direto com os produtos.

Recentemente, a ANVISA publicou o documento do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA), com análise de 12.051 amostras de 25 alimentos de origem vegetal, comuns à dieta da população brasileira, entre 2013 a 2015. O glifosato não foi analisado nas amostras.
Do total, 2371 (19,1%) amostras foram consideradas insatisfatórias para o consumo, sendo 362 por concentração de resíduos acima do Limite Máximo de Resíduos (LMR) e 2211 por resíduos de agrotóxicos não autorizados para uso no Brasil.
Os alimentos que apresentaram maior risco agudo foram a laranja e o abacaxi, analisados com casca. O pimentão e o tomate apresentaram maior parte das amostras com irregularidades, com dados semelhantes à análise de 2011 feita pelo mesmo Programa.
Embora a maior parte dos alimentos analisados sejam as frutas, legumes e verduras, não se pode perder de vista que a presença de resíduos de agrotóxicos está em produtos alimentícios que tem como ingredientes o trigo, o milho e a soja, predominantemente de sementes transgênicas.
Numa subanálise do município de São Paulo, num total de 262 amostras, 23% apresentaram resultados insatisfatórios devido à presença de resíduos de agrotóxicos acima do limite permitido e/ou não permitidos para a cultura, sendo elas: abobrinha, alface, batata, beterraba, cenoura, couve, maçã, mamão, morango, pepino, pimentão, repolho, tomate e uva.
E no que isso afeta sua saúde? Alguns estudos mostram que a exposição, tanto aguda quanto crônica, está relacionada a problemas gastrintestinais, neurológicos, reprodutivos, endocrinológicos e a determinados tipos de câncer.
Em 2015, a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) publicou pesquisa mostrando que o glifosato, a malationa, diazinoma, tetraclorvinfós e parationa são potenciais agentes carcinogênicos. O glifosato é um dos produtos mais usados mundialmente.
No Women Health Iniciative Observational Study, que acompanhou cerca de 93.000 mulheres na pós menopausa, encontrou-se consistência na relação entre a exposição à inseticidas e o risco de artrite reumatóide, especialmente entre aquelas com histórico de maior exposição em áreas rurais.
E o que você pode fazer para mudar esse cenário? Opte por alimentos da época, dê preferência aos produtores locais, ou alimentos com identificação do produtor, e alimentos orgânicos. Incentive a agricultura familiar! Ela produz a maior parte do que consumimos, sem uso de sementes transgênicas e agrotóxicos.
E, finalmente, enquanto sociedade, o que nos cabe fazer? O uso abusivo de agrotóxicos representa um problema de saúde pública e INCA, FIOCRUZ e ABRASCO (documento completo na biblioteca) publicaram documentos se posicionando contra as atuais práticas de agrotóxicos no país, ressaltando seu risco à saúde e chamando atenção para a necessidade de regulação e controle do seu uso e de ações de enfrentamento.
Há um Programa Nacional para Redução do uso de Agrotóxicos, o PRONARA, de 2015, com o objetivo de regular e assegurar a construção de programas de redução de uso de agrotóxicos, com conversão para sistemas de produção orgânicos e de base agroecológica. Você tem acesso a cartilha aqui.
Enquanto sociedade é necessário atuar na busca alternativas, além de exigir adoção de medidas severas que assegurem a saúde da população.
Quer saber mais? Tem 3 dicas de filmes/documentários ótimos sobre o assunto!
O veneno está na mesa
O mundo segundo a Monsanto
Nuvens de veneno
Referências
INCA. Posicionamento do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva acerca do agrotóxicos. Rio de Janeiro, 2015.
Parks CG, Walitt BT, Pettinger M, Chen J, Roo AJ, et al. Insecticide use and risk of Rheumatoid Arthritis and Systemic Lupus Erythematosus in the Women’s Health Initiative Observational Study. Arthritis Care & Research, 2011. 63 (2), pp 184–194
Landrigan PJ, Benbrook C. GMOs, Herbicide. N Engl J Med, 2015. 373 (8)
Tomitch R, Barchi CWCB, Castro Feitosa MCJ, Lobo RSV, Tamega Junior WP. Programa de análise de resíduos de agrotóxicos em alimentos – PARA: rastreamento dos alimentos com resultados insatisfatórios no município de São Paulo. São Paulo, 2016.
ANVISA. Programa de análise de resíduos de agrotóxicos em alimentos – PARA: relatório das análises de amostras monitoradas no período de 2013 a 2015. Brasília, 2016.
Carneiro FF, Augusto LGS, Rigotto RM, Friedrich K, Búrigo AC (org). Dossiê ABRASCO: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde. São Paulo: Expressão Popular, 2015.
Articulação Nacional de Agroecologia (Brasil). PRONARA já: pela implementação imediata do Programa Nacional para Redução de Agrotóxicos. – 1. ed. - Rio de Janeiro: AS-PTA, 2015.
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