Declarar-se doador de órgãos não basta!
- Fernanda Ramos
- 7 de mar. de 2018
- 3 min de leitura
No Brasil, cerca de 41.122 pessoas esperam por transplante de órgãos como opção de tratamento para diversas doenças. 26.507 pessoas aguardam por um rim, 11.413 por córnea, 1.904 por fígado, 389 por coração, 203 por pulmão e 64 por pâncreas. (Ministério da Saúde, 2017).
Do outro lado há um número muito menor de doadores, cerca de 1600 no primeiro semestre de 2017. Um dado comemorado, apesar de baixo, dado o aumento de 16% do número de doadores em relação ao mesmo período de 2016.

E existem diversas razões para tal cenário.
Primeiro e mais importante: no Brasil e em vários outros países, mesmo que você se declare doador de órgãos a decisão final da doação é feita pela sua família, no momento em que é determinada morte encefálica.
O fato da família ter a decisão final sobre a doação nos leva a outro dado importante: a recusa da autorização para doação é de 43% no Brasil. Na França esse número fica em torno de 30%, apesar de cerca de 80% das pessoas declararem desejo de ter seus órgãos doados. No Reino Unido as recusas são cerca de 50%.
Isso também nos leva ao desencadeador desse post: uma reportagem do início deste ano relatou que na França, a partir de 1 de janeiro de 2018, a doação de órgãos após morte encefálica tornou-se automática, independente do desejo da família, com o objetivo de aumentar o número de doadores para suprir a demanda das filas para transplante de órgão.
E é claro que isso causou muita polêmica por lá!
A decisão foi tomada com base em dados da literatura que explicam muito das estatísticas encontradas em diversos países.
Você pode pensar inicialmente que a recusa da autorização parece um ato egoísta e que desrespeita a vontade do familiar. Por outro lado, um segundo olhar mostra que há fragilidade emocional no momento da tomada de decisão.
A decisão deve ser tomada no momento de maior estresse da notícia da morte do familiar e, instintivamente, pode haver recusa da doação pela tristeza. Arrependimentos após a recusa não são raros.
Para os profissionais de saúde, cujo papel é conversar com a família e tirar todas as dúvidas, medos e preocupações sobre o processo, com vista também a respeitar a decisão da pessoa, a anulação do consentimento pela família acaba por minimizar o estresse, respeitando o momento de perda.
Mesmo entre doadores que registram o consentimento, aumentando o suporte para a doação, as sobreposições familiares ainda impedem a doação em muitos casos.
Em vários países são lançadas campanhas de conscientização sobre a importância da doação de órgãos, que, infelizmente, não são tão efetivas, com pouco ou nenhum aumento no número de doações. São necessárias políticas efetivas para atender a demanda crescente de transplantes de órgãos.
O que fazer, então?
Quer ser doador? Registe seu consentimento por escrito, converse com sua família a respeito do seu desejo, eleja um representante da família para ser contatado para tomar a decisão.
Declarar-se doador não basta. A família tem que estar ciente
para não anular a vontade do familiar.
A campanha do Ministério da Saúde para sensibilizar os parentes de pessoas com morte cerebral a doarem os órgãos de 2017 foi:

Shaw D, Georgieva D, Haase B, Gardiner D, Lewis P, et al. Family overrules? an ethical analysis of allowing families to overrule donation intentions. Transplantation Journal. 2017.
Siminoff FA, Gordon N, Hewllet J, Arnold RM. Factors influencing families’ consent for donation of solid organs for transplantation. JAMA, 2001.
Gazeta do Povo. França muda lei e torna doação de órgãos automática. Disponível em < http://www.gazetadopovo.com.br/mundo/franca-muda-lei-e-torna-doacao-de-orgaos-automatica-enjm2peyae93ltnb5jystoym3 > Acesso em 27 de fevereiro de 2018.

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